Um movimento para que as escolas de High School (equivalente ao Ensino Médio) comecem suas aulas mais tarde, permitindo assim que os alunos tenham mais horas de sono, vem ganhando força nos Estados Unidos. A ideia não é nova, mas vem conquistando cada vez mais adeptos com a recente publicação de vários estudos sobre os benefícios de ajustar o início das aulas ao relógio biológico dos adolescentes.
Nos últimos meses, até mesmo o secretário de Educação dos Estados Unidos, Arne Duncan, manifestou apoio ao movimento.
“Senso comum para melhorar desempenho estudantil que muito poucos implementaram: deixe os adolescentes dormirem mais, comece as aulas mais tarde”, disse Duncan em sua conta no Twitter. ”Acho que entramos no radar nacional”, disse à BBC Brasil a fundadora do movimento Start School Later (Comece a Escola Mais Tarde, em tradução livre), Terra Ziporyn Snider. Ela é autora de uma petição online, com assinaturas de moradores dos 50 Estados americanos, pedindo que o governo proíba escolas de iniciar as aulas antes das 8h.
Atualmente, segundo o Departamento de Educação, 42% das escolas públicas americanas de Ensino Médio começam as aulas antes das 8h.
“Acreditamos que, com algum tipo de padrão nacional ou estadual seria mais fácil para as escolas enfrentar a oposição (à mudança de horário)”, afirma Snider, que é doutora em História da Medicina.
Pesquisas
Segundo diversas pesquisas, quanto mais tarde o horário de início das aulas, melhor o desempenho dos adolescentes.
Nessa idade, além de sentir mais sono, eles costumam adormecer mais tarde, por volta das 23h. Com o início das aulas antes das 8h, não dormem as oito horas consideradas necessárias para que tenham um bom desempenho.
Um estudo publicado neste mês pela Universidade de Minnesota, comparando dados de 9 mil estudantes de oito escolas em três Estados, concluiu que escolas cujas aulas começavam a partir das 8h35 apresentavam melhores notas, maiores índices frequência e pontualidade.
Até mesmo as taxas de acidentes automobilísticos com motoristas de idades entre 16 e 18 anos foram reduzidas – em até 70% no caso de uma escola que mudou o horário das 7h35 para as 8h55 (muitos alunos nos Estados Unidos, onde a idade mínima para dirigir varia de Estado para Estado, vão de carro para a escola). O estudo concluiu ainda que estudantes que dormiam menos de oito horas por noite registravam mais sintomas de depressão e uso de cafeína, drogas e álcool.
Obstáculos
Mas apesar dos benefícios apontados pelas pesquisas, muitas escolas que tentam atrasar o início das aulas enfrentam resistência das comunidades, que nos Estados Unidos costumam ter sua vida organizada em torno dos horários escolares. Entre os principais obstáculos mencionados estão a interferência na prática de esportes, que geralmente ocorre após as aulas e, assim, sofreria atrasos. Além de dificuldades de reorganizar o cronograma dos ônibus escolares, que costumam fazer mais de uma viagem levando alunos de diferentes séries.
Adversários da mudança também costumam citar o impacto sobre os empregadores que têm estudantes como funcionários de meio turno, além do menor tempo para atividades extracurriculares. ”Mas o problema real é a norma social sobre o sono nos Estados Unidos”, diz Snider. “Simplesmente não encaramos sono e horário escolar, e questões de saúde pública, como questões importantes.”
Pioneira
O movimento para atrasar o início das aulas começou em meados dos anos 1990, quando pesquisas sobre o tema se tornaram mais populares.
Uma das primeiras escolas dos Estados Unidos a adotar a mudança foi a Edina High School, na cidade de Edina, no Estado de Minnesota.
Em 1995, após receber uma carta da Associação Médica do Estado alertando para as conclusões de estudos sobre o tema, a escola decidiu atrasar o início das aulas das 7h25 para as 8h30. ”No início, muitos pais me perguntavam: ‘Por que vocês estão fazendo isso’”, disse à BBC Brasil o superintendente da escola na época, Kenneth Dragseth, hoje aposentado.
“Muita gente pensava que os adolescentes simplesmente deveriam ser fortes e acordar cedo”. Segundo Dragseth, após ajustes iniciais, que incluíram mudanças nos horários dos ônibus e dos treinos esportivos, a mudança transcorreu sem problemas. ”No primeiro ano após a mudança, fizemos uma pesquisa com os pais, e 96% disseram que estavam satisfeitos”, lembra. ”Uma pesquisa com os alunos demonstrou que estavam se saindo melhor nos testes e mais satisfeitos com o ambiente escolar”, afirma Dragseth.
Esforços
Nos últimos anos, escolas em todo o país vêm adotando horários mais flexíveis. No entanto, para muitos estudantes isso ainda é um sonho distante.
“Se quiser tomar banho, arrumar o cabelo e comer alguma coisa, preciso acordar às 5h45 para chegar à escola a tempo do início das aulas, às 7h40″, disse à BBC Brasil Rhian Williams, estudante do penúltimo ano do ensino médio no Estado de Michigan. Ela conta que costuma dormir depois da meia-noite e sempre deixa três despertadores ligados, mas muitas vezes acaba conseguindo sair da cama somente às 7h. “Saio correndo de casa, sem comer nada, e tenho que dirigir em alta velocidade para não chegar atrasada.”
Ryan Edwards, 17 anos, prestou depoimento sobre sua rotina ao conselho escolar de sua região, no Estado da Virgínia, em uma discussão sobre a possibilidade de mudar o horário das aulas, que começam às 7h20. Ele acorda às 6h15 e, depois da escola, trabalha em um restaurante. Nunca chega em casa antes das 22h30. ”Eu costumava ser um estudante nota A, mas desde que comecei o Ensino Médio, minhas notas caíram. Às vezes mal consigo ficar acordado durante as provas”, disse Edwards à BBC Brasil.
Mudança
Carrie Close, 18 anos, estudante do último ano do Ensino Médio em Farmington, no Maine, chegou a redigir uma proposta para apresentar às autoridades locais pedindo mudanças no horário, mas a iniciativa não foi adiante. ”Costumo acordar às 6h para estar na escola às 7h45. Não tenho tempo de tomar café da manhã e estou sempre com fome”, disse Close à BBC Brasil.
“Obviamente não me sinto motivada a estudar. Hoje, primeiro dia de primavera (no Hemisfério Norte), quando acordei ainda era noite e nevava”, conta.
Snider observa que os pais também sofrem com a situação, e cita a experiência com seus três filhos (o mais novo acaba de ingressar na faculdade).
Mas ela acredita que a atenção que o movimento vem ganhando vai acabar mudando a percepção pública. ”Esse tema tem de ser encarado como questão de saúde. Isso, ao lado de esforços locais, vai levar a uma reforma”, acredita.
Fonte: BBC Brasil
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